sábado, maio 20, 2006

Pop Lit

Tenho feito questão de, nestes últimos anos, ler todos aqueles livros dos quais muitos gostam e que uma pequena minoria critica acerrimamente e depois olha de lado com despeito. A verdade é só uma: esses livros são escritos para serem lidos por muitos e para que muitos deles gostem.

Margaridas Rebelos Pintos, Dan Browns, Harry Potters (dos quais eu até nem desgosto, apesar de achar a fórmula algo gasta), Susanna Tamaros, Nicholas Sparks e tantos outros. E não os houve noutras épocas? Walter Scott não escrevia livros que eram amados pelas multidões e odiados pelo mundo da erudição crítica (já agora para os que não sabem, Scott tem um romance chamado «Anne of Geierstein: or The Maiden of the Mist» de 1829 que mete ordens secretas, cátaros e a igreja, Opus Dei e etc)? Dickens não foi considerado, no seu tempo, um fazedor de dinheiro, como Balzac, como Dumas? Curiosamente, hoje fazem parte do cânone.

A resposta é tão simples quanto evidente: há literatura "popular" que é boa, da mesma forma que há literatura "elitista" que é má. Há uma selecção natural da literatura que sobrevive. E depois há factores especiais que fazem com que essa literatura entre ou saia do cânone a diversos momentos, por exemplo: o nosso caro «Tom Sawyer» é neste momento considerado um livro politicamente incorrecto cujas vendas cairam abruptamente nos EUA desde esse decreto. Será que vai sobreviver?

Mas um «Sherlock Holmes» faz parte do cânone literário, da mesma forma que os «Três Mosqueteiros», da mesma forma que «Oliver Twist» ou «David Copperfield», tal como «Sandokan» ou os livros de Jules Verne.

Quais as conclusões?

Que a crítica é perene e está geralmente errada fora do contexto da época (quantos não são os milhares de livros que já li de finais do século XIX a começos do século XX, que vaticinam opúsculos sombrios como obras imortais?).

Que o mundo crítico e académico não é nem nunca foi capaz de descer do seu pedestal de grandiloquência e admitir a razão das massas. Que é sempre elitista, tapado e preconceituoso (ainda hoje no mundo académico português, Saramago recebe as famosas miradas de soslaio e é mencionado com um certo trejeito de boca).

Que numa altura em que se fala de crise de leitura (até parece que é original e que não se queixavam do mesmo os editores de há cem anos, vejam as cartas de Eça e de Camilo aos seus editores e vice versa), talvez fosse conveniente que a literatura erudita, que tanto se ofende da concorrência, aprendesse alguns dos mecanismos da boa literatura "pop" para ganhar autores em vez de se tornar hermética e fechada e mesquinha no seu intuito de agradar a uma crítica e a uma academia que não assegura quaisquer benefícios materiais e muito menos qualquer certeza de um lugar no pódio da grande literatura do futuro.