quarta-feira, dezembro 20, 2006

A Susceptibilidade de Ferir Sensibilidades

Foi há duas noites que, chegando a casa e iniciando a normal procura de alternativas viáveis ao Malato (também conhecida como zapping), se me deparou, na RTP Memória, uma reposição notável do não menos notável «A Paixão de Jane Eyre» com o Orson Welles, a Joan Fontaine e a Liz Taylor ainda criança. Notável lamechice cinematográfica daquelas que me faz, sempre que o sono não vence, ficar em frente ao ecrã a admirar como o público era crédulo noutras eras - e talvez fosse isso que tornava muita da magia do cinema possível.

Perdido como estava naquele meio preto & branco, eis senão quando reparo num elemento que perturba a harmonia do filme: uma bolita vermelha no canto superior direito do ecrã.

Pois é, meus amigos. Alguém achou que aquela santa inocência de filme feria susceptibilidades. A única coisa que me ocorre é o tratamento ríspido que a jovem Jane sofre no colégio para orfãs. Mas que susceptibilidade é que aquilo fere quando, noutros canais, os senhores dos anéis batalham com criaturas medonhas, são trespassados por espadas e jorram sangue, e a meio de tardes familiares irrompe pelos televisores o Steven Seagal a alinhar os rostos inicialmente disformes dos maus...? a Jane Eyre tem de andar à chuva com duas candeias nas mãos por ter emitido uma opinião.

Será que os censores estão a ficar profundos ou vítimas de loucura? Pergunto isto porque a bolinha era daquelas vermelhas recentes, não era antiga. Eu aposto na profundidade dos censores; começaram a censurar as mensagens que aludem à censura. Brilhante.