domingo, novembro 05, 2006

Seis máximas em filigrana(zinha) [ou De Umas Coisas Que Eu Talvez Tenha Aprendido]

1. Não vale mesmo nada a pena desejar aquilo que não se pode ter e, quando se toma consciência disto, é frequente querer segurar contra todos os riscos aquilo que se acha que se tem (e, já agora, guardar a apólice num cofre atrás do quadro mais feio lá de casa), o que não é de todo ilegítimo, mas apenas inconveniente e inestético.

2. Salivar por aquilo que não nos pertence, como o tal cãozinho que ficou famoso por ser normal, é inútil. A vida é muito curta, pelo que o arrependimento é uma perda de tempo. O melhor a fazer é deixar os dois pássaros voar e, se entretanto aparecer um terceiro que queira ser preso, apoderamo-nos dele para já não nos poder acusar de encarceramento não consentido. O máximo que pode acontecer é não termos aprendido lição nenhuma e sermos, no fim das contas, nós a ficar engaiolados. Só quero acrescentar, como diz o tio Vinicius, «quem nunca curtiu uma paixão/nunca vai ver nada, não (…) /não há mal pior do que a descrença/mesmo amor que não compensa/é melhor que a solidão» – e isto não se aplica só ao amor, mas também ao trabalho e a todas essas dimensões dolorosas da vida.

3. Tudo o que nos pertence não nos pertence; o Tempo, esse ancião rabugento e sem credibilidade nenhuma – pois ninguém sabe de onde veio nem para onde vai (se bem que, relativamente à última questão, a Eternidade faz as suas reivindicações) – é o proprietário de todas as nossas coisas, mesmo que tenhamos o talão Multibanco com o nosso nome e que as câmaras de vigilância tenham gravado o momento no qual pagámos os haveres.

4. Galileu não era patriarca, Copérnico não tinha património e a Suíça bem podia dedicar-se mais aos canivetes.

5. O Paraíso é um lugar engraçado: tem céus azuis e prados verdes, os anjos servem banquetes (mesmo contrariando os Gourmets que se queixam de ter de cozinhar para tão pouca gente) e o primeiro andamento, Allegro ma non troppo, da Sexta Sinfonia do Surdo toca em repeat no i-Pod de cada um. Os serviços informativos do Paraíso funcionam bem, até nos supermercados, onde é frequente ouvir «Tum tum tum tum: “Estimado cliente: a partir das 19 horas teremos descontos de até 70% na secção dos impossíveis.”»

6. A impossibilidade pode, em vez do fim, ser antes o começo.

2 Comments:

Blogger Carla Luís said...

Ena, isso é que são reflexões!
Ou melhor, eu quase diria... "um tratado"! ;)
Baci!
***

06 novembro, 2006 11:07  
Blogger T said...

Beijinhos para as duas fotógrafas e obrigada pelos comentários***

06 novembro, 2006 23:06  

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