Sobre não sei o quê
Na quinta-feira à noite sentei-me no sofá a comer bolachas, agarrei no controlo remoto do televisor e comecei a mudar freneticamente de canal. Passei pela SIC, pelo Infinito e pelo People and Arts. O Mezzo tinha ópera, a RAI tinha um concurso e o Eurosport passava um campeonato de Curling. A RTP tinha qualquer coisa, A Dois: também tinha qualquer coisa. Voltei a passar na SIC. Depois a TVI. Não, a TVI não. Voltei à SIC. Mil novecentos e noventa e troca o passo. Catarina Furtado estava na cama, vestida de preto, tapada por um lençol acinzentado. Estava a discutir com o Paulo Pires. Ou melhor, a fingir que discutia com ele. No meio da discussão disse qualquer coisa do estilo «este homem só apareceu nas nossas vidas para semear a miséria e a discórdia». Entretanto uma actriz, que fazia de jornalista, apareceu a discutir com outro actor, que fazia de editor. Ela dizia «não sei o quê, o Tomás Sobrado» e ele dizia «já conheci muitos jornalistas impetuosos como a menina, mas depois mudaram», e depois ela dizia «o senhor devia seguir os princípios éticos e deontológicos de que tanto fala, não sei o quê» ao que ele replicou «a ética só subsiste como se fosse uma estética financeira» tendo ela respondido «até parece que está a falar da coisa mais natural do mundo». Depois apareceu a Bruxa sénior dessa novela de putos, mas em loira, e disse ao Pepê Rapazote «não sei o quê», ao que ele respondeu «por acaso o António tem passado mais tempo em casa do Gonçalinho que cá em casa», tendo ela indagado, de seguida, «isso é uma crítica?», sendo que depois ele disse «não, Tareca, claro que não».
Das duas uma: ou as produtoras da TVI têm mesmo razão e a ficção portuguesa melhorou, ou o nosso vocabulário tem empobrecido bastante nos últimos anos.
Das duas uma: ou as produtoras da TVI têm mesmo razão e a ficção portuguesa melhorou, ou o nosso vocabulário tem empobrecido bastante nos últimos anos.
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